segunda-feira, 16 de agosto de 2010

A minha primeira tatuagem





Nunca tive cicatrizes. Claro, tive algumas daquelas do tempo dos anos 80. Joelho ralado, cotovelo marcado. Do tempo em que podíamos ir pra rua depois de descansar o almoço e só voltar quando estivesse escurecendo. Sem celulares, sem internet...Fora essas que qualquer um com mais de 20 obrigatoriamente tem, nunca passei por nada que deixasse alguma marca profunda no meu corpo.
Sempre fui esquiva. Brincava no limite, não inventava de subir em árvores das quais provavelmente não saberia descer. Não pulava muros, só passava por baixo de cercas. O que me permitia de maneira mais segura conhecer novos lugares. E esportes... Bom, providencialmente minha mãe acreditou que eu tinha uma hérnia e eu nunca fiz educação física. O meu lado Amélie Poulain.
Se o meu corpo era esperto, os meus sentimentos não ficavam muito para trás. Sem dramas, como postulo aqui à exaustão. Nada de ficar traumatizada com brigas de pais na infância,nada de inventar complexo de rejeição por ser a filha do meio, nada de acabar com a auto-estima por não fazer parte da versão tupiniquim das cheerleaders. Nada de evitar amar e ser amado diante da primeira rejeição. Essas coisas vivem acontecendo, outras não tão fáceis assim ( essas omitimos, mas igualmente damos continuidade à vida), mas por que desistir?
E dessa forma, cheguei até aqui. Sem cicatrizes. E vivi.
Logo, quando fiz minha primeira cirurgia ainda aos vinte e pouco, me assustei com aquela cicatriz que me encarava todos os dias no espelho. Primeiro escondida em esparadrapos, depois surgindo e virando parte do que reconhecia como sendo eu. Eu tinha uma cicatriz, visível para o mundo e para mim.
Sempre quis fazer uma tatuagem, mas nunca me decidi sobre o desenho. Hoje fizeram uma em mim, sem consultas prévias. Fina, ao longo do pescoço. E pela primeira vez na vida entendi que não é possível esquivar-se de tudo. Finalmente consegui uma marca no corpo repleta de significados. Mais do que dragões e carpas que tanto desejei.
A minha primeira cicatriz foi a minha primeira tatuagem.

4 comentários:

  1. Fabi!!!!
    A cada texto você me surpreende!!! Seu texto flui tão fácil, mas é profundo, complexo e, sem ser meloso ou dramático, toca!
    Eu tb tenho tatuagens,lembra? Nas duas pernas, kkkkkkkkkkkkkkkkkkkkkk São mt sexys, kkkkkkkkkkk

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  2. Ai Fabi, que lindo!!
    Enquanto alguns disfarçam com tatuagens uma cicatriz, vc valoriza a marca que adquiriu através da cirurgia, isso é sinal de aceitação e amadurecimento!
    Eu tenho várias, mas nenhuma que mereça ser observada, kkkkk a não ser aquela, em forma de acento agudo um pouco acima do joelho, e tem história, tatuagem causada por uma garrafa de champagne!!kkkkkk

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  3. É verdade, Jon! E eu lembro da primeira vez que as vi. São poderosas. Asas de Hermes.
    Agora quero ver a tatuagem luxuosa da Elisa!

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  4. Muito bom.
    Sua primeira tatuagem é só a primeira cicatriz visível a terceiros.
    Voce teve outras, só suas.
    Uma tatuagem é expor a cicatriz ao mundo.

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